General Antônio Ernesto
Gomes Carneiro
Por Dorothy A. Gomes Carneiro
Em 30 de outubro de 1893, o Coronel Antônio Gomes Carneiro, então no
“Comando do litoral do Rio de Janeiro”, é convocado ao gabinete do Presidente
da República-Marechal Floriano Peixoto-Que de imediato, ao recebe-lo, lhe diz:
-“Carneiro, não me negue este serviço”.
General
Carneiro, o grande herói da resistência da Lapa.
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Antes de 48 horas da realização
desse encontro, depois de vãos apelos ao Ministro da Guerra e ao Ajudante
General para obter reforços, Carneiro despede-se da família e segue para São
Paulo, onde faz contatos com o Presidente da Província e outros, que ali
preparam, a Resistencia aos farroupilhas.
Aperto de mão entre Marechal
Floriano Peixoto e Antonio E. G. Carneiro
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Antônio E. G. Carneiro com seu pai Marciano E. G.
Carneiro
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-“BAM...BALALÃO...SENHOR CAPITÃO...” – cantava Antoninho, aos 5 anos,
e afirmava: “Vou ser soldado! Vou ser um guerreiro valente! Atacar!”.
A vida seguia seu curso, ainda
criança, Antoninho vai para Diamantina estudar, e, enquanto estudava, seu pai
reúne recursos para mandá-lo ao “Preparatório”, no Colégio São Bento, Rio de
Janeiro. Em meados do ano 1860, sem ter completado 14 anos ainda, Antônio
ingressaria no Curso de Farmácia.
Vai, então, morar numa pensão, onde
tem como companheiros, Teixeira Soares, cujo nome está ligado à Estrada de
Ferro Curitiba-Paranaguá, e Manoel Pedro Santos Lima, mais tarde destacado
político paranaense.
E, lá estava o jovem Carneiro, “O herói da Revolução Federalista”,
inconsciente dos papéis que o destino lhe reservava, aos 14 anos, envolvido em
seus estudos e pílulas medicamentosas.
Mas, é impossível falar de Carneiro
sem lembrar de seu ideal de gurreiro, e, sem lembrar, ainda que em rápida
pincelada, oque fora a “Revolução
Federalista” – movimento em que revoltosos pretenderam a implantação de uma
“Nova Ordem” pela mudança do “Regime Político”.
Em 1889, havia sido proclamada a
República, e, em 1891, o Marechal Floriano Peixoto foi eleito Presidente da
República e assumiu o cargo em um momento social,política e economicamente
muito difícil para o País.
Tropa Federalista "os Maragatos"
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Carneiro com o Estado Maior das
tropas regulares e de patriotas, que, com bravura, defenderam a cidade da
Lapa.
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Carneiro e um punhado de bravos na Lapa, sustentam a praça com denodado
valor, dando a Floriano o tempo necessário para fortalecer-se, organizar-se e
por fim, desbalatar a Revolução
Federalista.
Esquecendo as tragédias de uma luta
fratricida, será sempre preciso lembrar que a “Resistência da Lapa”, é , o
maior feito de Resistência Militar na história do Brasil. E mais, foi a
contribuição decisiva, não só para a Consolidação
da República, como também para a Conservação
da Integridade do Brasil como Nação.
E a quem se deve tão brilhantes
resultados?
Deve-se a uns poucos soldados e a um
punhado de homens despreparados para a guerra, e também, a um bravo e valoroso
comandante, capaz de se tornar inspiração para seus comandados e de sustentar o
ânimo da população sitiada, pela coragem e determinação de que era dotado.
O que fez que Floriano ao receber a
notícia da capitulação daquele bastião, exclamasse: “A Lapa caiu?! Então o carneiro morreu!
Outros
lembrarão a morte dos amigos.
Tragédias
familiares!
A
incapacidade deperdoar...
Recordarão
a fome, a sede, o medo, a falta de medicamentos, o horror da violência.
Mas o fato real único – da Consolidação e da Conservção da Integridade
do País como Nação – não pode ser esquecido!
Como também para sempre deve ser
lembrado de que é a este Estado, ao Paraná, que se deve, em grande parte a
glória dessa realização.
Esqueçamos, por algum tempo os
horrores da luta e voltemos à históriado jovem Carneiro e de sua vida de
estudante bruscamente interrompida em 1865 pelo seu alistamento como um dos
primeiros Voluntários da Pátria, para
lutar na Guerra do Paraguai. Foi de imediato incorporado e seguiu, logo depois,
sob o comando de João Manoel Mena Barreto, para a frente de guerra.
De imediato, Carneiro galgou os
postos de anspensada, ainda a bordo, depois furrel, segundo e primeiro
sargento, sempre por seu valor e coragem.
Após o Combate de Estero Bellaco,
onde se destacara mais uma vez, e foi gravemente ferido, ainda no hospital
recebeu o posto de Alferes.
Muitas vezes citado por Caxias e
pelo Conde D’Eu em boletim, recebeu em julho de 1869, com os galões de Tenente,
a missão de flanquear o desfiladeiro de Sapucay e assaltar Peribebuy.
Citando Calmon (1933): “Quando Carneiro, exausto, embainha a espada
e julga morrer, do sofrimento que lhe causa a contusão, não havia mais
paraguaios na praça.”
E o Tenente Gomes Carneiro vingara a
morte de seu chefe o Ilustre General Mena Barreto a quem vira morrer no
combate.
Hospitalizado por 3 meses, Carneiro
volta em seguida ao campo de batalha. A guerra fizera do jovem aprendiz de
farmácia um homem resoluto que se apresentou em seu posto assim assim que saiu
da enfermaria.
Finda a guerra, Carneiro se
fortaleceu em novas missões. Na Escola de Tiros de Campo Grande, em 1876, sob o
comando de Antônio Tibúrcio Ferreira de Souza, foi o primeiro aluno da turma e
recebeu uma espada com empunhadura de marfim, doada por seus colegas. Honrou
essa dádiva e dela nunca se separou.
General Tibúrcio
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Prepara-se o desenrolar de uma
tragédia, ao atracar no Rio de Janeiro do Paquete Manaos, onde viajava a
família de Carneiro, desprende-se a corrente do leme e atinge uma criança que
brincava no tombadilho, esmagando-lhe as duas pernas logo abaixo dos joelhos. O
grito lanciante de dor do pequeno Mário Tibúrcio, de apenas 3 anos, leva horror
a todos no navio, mas ninguém corre tão desesperrado como Carneiro.
Sustenta-lhe o filho nos braços, seu amigo Capitão Pego Júnior. Providencia-se
um escaler e marujos levam o menino ensanguentado para o porto e em seguida
para a Santa-Casa.
À cidade já chegara a notícia. Todos
estavam consternados com o sofrimento daquela criança, filho e neto de heróis
da Guerra do Paragay. Carneiro é
recebido com a maior atenção pelos melhores médicos da Corte e os melhores
cirurgiões se empenham no atendimento a Mário.
No dia seguinte, quando Carneiro
prestava guarda ao lado do leito do filho, tendo junto de si a esposa Margarida
em prantos, eis que entra no quarto a figura imponente de todos conhecida – Dom
Pedro II.
Fora ele quem dera ordens para um
atendimento especial à criança. Carneiro se comove intensamente, quando o
Imperador ao despedir-se, depois de confortar o menino e a mãe, afirma à
Carneiro: “Encomendarei da Europa os
aparelhos para que Mário possa voltar a andar. Faço questão de ser o
responsável popr todo o tratamento.” E, apertando as mãos de Carneiro e de
Margarida Octávia, retira-se. Reforçando as ordens para o melhor e mais
cuidadoso atendimento à criança.
Emoção e gratidão, por Carneiro
nunca esquecidas, levaram às lágrimas o herói de tantas batalhas.
E foi por tais motivos que quando
das ações que levariam ao fim do Império, Carneiro, que por sua integridade de
caráter, não poderia esquecer o que o Imperador fizera por seu filho,
afastou-se da capital e assumiu o posto de Chefe
de Construção de Linhas de Telégrafo de Cuiabá ao Araguaya, que ideara.
Cândido Mariano da Silva Rondon
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Por ocasião das comemorações do
centenário de nascimento de Gomes Carneiro, Rondon já idoso, enviou para ser
lido, um documento narrando a trajetória gloriosa que juntos empreenderam.
Citando: “ Foste tu Carneiro o Engenheiro Militar que
primeiro construiu no sertão habitado por índios ainda hostis, uma linha
telegráfica de campanha. E a levaste ao cabo em 13 meses, através de um sertão
de 600 quilômetros de extensão e do divisor meridional das duas maiores bacias
hidrográficas do Brasil. Comprovaste nessa campanha as raras aptidões militares
que trouxeste do campo de batalha e as edificantes qualidades práticas ali
demonstradas, na coragem, prudência e firmeza que te houveste no cumprimento do
dever até o fim da áspera jornada sustentada a todo custo pelo teu inflexível
caráter.”[2]
Voltemos à Lapa...
Assim que chega, Carneiro escreve à
esposa: “Margarida, aqui me encontro
desde 25 cedo e só a 27 à tarde me foi entregue o comando.” E, referindo-se
às condições em que se encontra, escreve: “Argolo[3]
levou munições, oficiais e praças.”
A luta prosseguia noaParaná com as sucessivas
vitórias de Gumercindo Saraiva, Curitiba caíra, o Governo do Estado fora
trasferido para Castro. Só restava um bloco de resistência aos Maragatos, a
Lapa!
A Desproporção numérica entre os
sitiantes, bem como as condições de combate das forças de resistência
eramgritantes. Contra os 3 mil de Gumercindo Sariva, Carneiro não contava mais
do que com 750 combatentes.
Quem assinala a diferença é o
historiador Calmon (1933): “...começavam
por não ter fardamentos, o chapéu era o dos tropeiros...As botas de
viagem...pastores e ervateiros...mais tarde, num milagre de boa vontade
moveram-se, destramente ao toque de clarim.” E continua o autor: “...a gauchada escanchada nos potros uruguaios,
sobre uma sela embrulhada de lã de ovelha, entalava no cinturão a navalha
castelhana ou o cutelo largo e sólido da degola.”
E foram esses simples guerreiros,
chefiados por Carneiro, homens que nem sequer conheciam os toques de clarim,
que sob o comando de seus heroicos chefes, garantiram a sobrevivência da
República, a integridade do País e escreveram a mais bela página de resistência
em nossa história.
Não resistindo a sua alma de
guerreiro, durante o sítio, Carneiro faz ainda algumas incursões sobre o
inimigo e o combate do Rio da Várzea é narrado entusiasticamente por Jobim
(1952).
Mas, Carneiro continuava a receber
reiterados telegramas de Floriano repetindo a ordem: “Não combater. Resistir. Resistir.”
Em 15 de janeiro, sabendo que estava
completado o cerco, o Comandante resolveu ensistir com as famílias para que partissem
em um último trem que seguiria rumo a Curitiba. As lapeanas se reuniram e
mostraram sua fibra, enviando sua resposta: “Iriam sim, se pudessem levar consigo irmãos, noivos, maridos e filhos
que estavam entre os combatentes.” Carneiros argumentou que isso seria
impossivel. A resposta não tardou: “Então,
corremos com eles os mesmos riscos.”
Joaquim Lacerda e
sua esposa Madalena de Lacerda em 1893
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E, assim estava a Lapa quando em 24
de janeiro, movido pela corajosa resistência dos habitantes sitiados, Caneiro
fez afixar sua carta:
“Aos
Habitantes da Lapa.
Desde o dia 16 do corrente, que sofreis os ataques dos
inimigos da República, aos quais tendes sabido resistir com patriotismo e valor
que ficarão gravados em nossa história, como belo exemplo para vossos filhos.
Congratulo-me convosco, pelos triunfos que alcançastes,
peço-vos uns dias mais de constância e resignação em bem dos vossos próprios
interesses e da República que estará muito brevemente vencedora por toda parte
e em paz.
Viva
a República
Viva
a Legalidade
Viva
o Povo Lapeano.
Lapa,
24 de janeiro de 1894.
Coronel Antônio Ernesto Gomes Carneiro
Comandante de Divisão”
Coronel Antônio E. Gomes Carneiro
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O batalhão nunca chegou!
Floriano faltou ao encontro marcado!
O Triste Mês
Sangrento
06/02/1891
Batalha Final
A violencia è aterradora.
A Lapa padece de fome, sede, medo,
falta de munição e de medicamentos.
O desespero se acerca de homens e
mulheres que ainda resistem.
Os maragatos chegam à rua da Boa
Vista e caçam a tiros os lapeanos.
Há cadáveres expostos por toda
parte.
O combate é decisivo.
Casas atingidas pelo Canhoneiro, Cerco da Lapa, em 1894.
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Deixa
Dulcídio na Matriz e segue rápido na direção da farmácia Westphalen.
Percebe
a situação e ordena:
-“Façam uma barricada em defesa do beco.
Tenente
Henrique, mande fazer pontaria! Firme!”
A
ordem não pode ser cumprida o Tenente recebe um balaço no peito.
Carneiro
corre a atende-lo.
Fica a
descoberto, ao alcance da pontaria inimiga.
É
ferido e ainda prende entre os braços o jovem que morria.
O
Tenente Sisson se aproxima e assume o canhão.
Gomes
Carneiro ainda grita seu último comando;
Casa e Trincheira, Cerco da Lapa, em 1894.
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Lacerda
surge com uma coluna de voluntários. Ao fixar Carneiro percebe que ele já não
tem mais forças. Está gravemente ferido. Abraça-o e leva-o juntamente com
Emílio Blum para a casa de Pedro Fortunato.
Avisado,
João Candido deixa o hospital de sangue e corre de imediato.
Ao ser
examinado Carneiro, serenamente, fixa os olhos no médico e lhe diz: “Qualquer que seja a gravidade do ferimento,
diga que é leve.”
Mas, o médico percebe que a bala
atravessa o corpo de Carneiro e lhe rasgara o fígado e o estômago.
A luta continua.
Sisson
acerta uma granada na casa de Francisco de Paula. A casa Explode.
Como
que aturdida, a facção inimiga que se espalhava pela Rua das Tropas.
Recua.
A
gente da Lapa, a arma branca, ataca o inimigo.
Lacerda
está à frente.
Amintas
é ferido.
A sua
tropa vinga-se, abatendo o inimigo a golpes de baionetas.
O
combate se trava palmo a palmo e já se contam às centenas os feridos.
A Rua
das Tropas fora recuperada.
Fim de
um Herói.
"A Morte de Carneiro" -
Quadro de Theodoro De Bona.
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Do alto dos morros a artilharia
inimiga fazia atroar com fúria os seus canhões. Como que por coincidência
prestavam honra fúnebre ao grande herói da Resistência.
O corpo do General Carneiro é
levado à Igreja Matriz da Lapa em 09/02/1894.
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Termino com as palavras do Ministro
Mário Tibúrcio Gomes Carneiro:
-“...permita
Deus que o solo desta terra nunca mais estremeça ao tropel das lutas
fratricidas, e se, (meu pai) o exemplo de tua firmeza, de tua abnegação, da tua
bravura, da tua dignidade militar houver de ser invocado que seja para salvar e
defender o Brasil.”
Peço agora:
-“
Que nos braços de Deus repousem todos aqueles heróis e que o Senhor os tenha com
o mesmo amor que nós lhes dedicamos ao relembrar os seus feitos e sua nobre e
inesquecível história.”
“Requiem aeterna
Donna eis Domine “Conceder-lhes o descanso eterno,
ó Senhor
Et lux perpetua
luce at eis. E que a luz perpétua,
mas a luz deles.
Pie Jesu Domine Jesus Misericordioso
Donna eis
Requiem.” Conceder-lhes descansar."